Brasil registra média de 1,7 mil casos de crimes de ameaça por dia na Justiça

Volume de processos sobre o tema segue em alta, com aumento significativo nos primeiros meses do ano; estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Paraná lideram em quantidade de ações

Brasil registra média de 1,7 mil casos de crimes de ameaça por dia na Justiça
Brasil registra média de 1,7 mil casos de crimes de ameaça por dia na Justiça (Foto: Reprodução)


Entre janeiro e setembro de 2024, o Brasil registrou 490.375 novos processos relacionados ao crime de ameaça, com uma média diária de 1.790 novos casos. É o que aponta levantamento inédito com base no BI (Business Intelligence) do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), por meio da consolidação dos dados e da verificação dos assuntos presentes nas tabelas de gestão processual do órgão. Esse volume confirma o crime de ameaça como o principal motivo de ajuizamento na área de Direito Criminal.

Os estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Paraná apresentam os maiores índices. São Paulo lidera com 77.848 novos processos até setembro deste ano, uma média de 284 novos casos por dia. O Rio Grande do Sul, com 61.713 processos, registrou uma média diária de 225, enquanto o Paraná acumula 44.348 novos casos, com média de 162 ao dia. No ano completo de 2023, a Justiça brasileira registrou 617.988 novos processos com um aumento de 11,9% com relação ao ano anterior. A média diária foi de 1.693 ações por dia.

O crime de ameaça, previsto no artigo 147 do Código Penal, ocorre quando alguém promete causar mal injusto e grave a outra pessoa, gerando temor ou insegurança na vítima. Essa ameaça pode ser feita de forma verbal, escrita ou até mesmo por gestos, desde que tenha potencial para intimidar. Não é necessário que a ameaça se concretize; o que importa é o impacto psicológico que ela causa. "Boa parte das ameaças acontece em momentos de desentendimento emocional, como brigas entre parentes, vizinhos ou conhecidos. Muitas vezes, as pessoas falam sem pensar e acabam subestimando a gravidade do que dizem, sem se dar conta de que suas palavras podem ser enquadradas como crime", relata o advogado criminalista Arthur Richardisson, membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça.

Para o especialista, é importante lembrar que o crime de ameaça pode ser confundido com outras infrações, como injúria ou calúnia, especialmente em casos de conflitos mais complexos. "Uma análise cuidadosa do contexto é essencial para garantir que o acusado não seja prejudicado por interpretações equivocadas. O ambiente virtual ampliou as formas de comunicação, mas também os conflitos. Mensagens que antes poderiam ser esquecidas agora ficam registradas e podem servir de prova em processos criminais. Isso torna ainda mais necessário o cuidado com o que se escreve online", frisa.

Como evitar o crime?

De acordo com especialistas, o aumento dos casos de ameaça no Brasil, visível no crescimento expressivo de processos, também está em parte relacionado a uma maior conscientização sobre o direito das vítimas, bem como à ampliação dos canais de denúncia, especialmente pelas redes sociais e plataformas digitais. E esse crescimento revela também uma fragilidade na segurança pública e a necessidade de medidas mais eficazes para proteger grupos vulneráveis, como mulheres, que enfrentam violência e intimidações constantes, especialmente nas redes sociais.

João Valença, criminalista do VLV Advogados, destaca a importância de iniciativas preventivas para evitar uma escalada das ameaças para crimes mais graves. “A conscientização das vítimas sobre o registro de ocorrências é fundamental. Muitas vezes, ameaças ignoradas podem evoluir para situações mais perigosas. As autoridades precisam garantir suporte para que as vítimas possam se sentir seguras ao denunciar, e políticas de prevenção e campanhas educativas são essenciais para mitigar esses números”, observa o advogado.

Já a criminalista Vanessa Avelar Fernandez, do Avellar Fernandez Advocacia, ressalta como a prevenção ao crime de ameaça começa com a conscientização. "No contexto da violência doméstica, é essencial que a vítima notifique a ameaça para que as autoridades possam tomar as medidas cabíveis. A morosidade do Judiciário é um reflexo de diversos fatores, como a falta de notificação de muitos casos. Muitas vítimas demoram para tomar a decisão de denunciar, o que acaba agravando a situação”, alerta.

Dado o crescente volume de processos, o Judiciário tem reforçado a importância de campanhas de conscientização e políticas de prevenção para atenuar a demanda. A tipificação do crime de ameaça e sua resolução acontecem ainda relativamente rápido por conta do seu enquadramento como crime de menor potencial ofensivo. A pena de ameaça é de detenção em regime aberto ou semiaberto, e a aplicação de penas alternativas, como multas ou transação penal, é muito comum. Isso ajuda a evitar a superlotação do sistema carcerário e dá celeridade à resolução dos casos.

Para Bruna Brossa, sócia do escritório Brossa e Nogueira Advogados, cabe a cada um cumprir o seu papel para reduzir o volume alto desse tipo de problema. “É fundamental evitar declarações impulsivas e lembrar que a falsa sensação de anonimato nas redes sociais não protege ninguém. Ameaças podem gerar antecedentes criminais e prejuízos significativos à vida do autor, mesmo que não haja condenação formal”, finaliza.

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